quarta-feira, 24 de novembro de 2010

CIRCO PALOMA 4: ZÉ MIÚDO E CORCOVA

Tem muita gente que já viu leão pelo sertão, mas disse que era suçuarana pra não ficar com fama de louco ou de mentiroso. Tinha pelo menos uns quatro entre Juazeiro e Paulo Afonso, tudo solto. Fugido de circo, comendo cabras e cobras. Corcova era um deles.
Zé Miúdo era grande, se virava de qualquer jeito. Tanto se virou nessa vida, que virou contorcionista. Numa tarde, viu um leão, mas disse aos outros que era suçuarana. Viu de novo e de novo. O leão rondava o circo, sentia o cheiro de múmia, carne de sol. Juvenal. O mágico que perdera a magia há tempos, bem antes de encontrar Esperança, que ainda era criança, 12 anos, corpo de mulher.
Os olhos da Esperança eram retos, vazios, feito uma sala sem móveis com um único espelho, bem lá no fundo. Todos se viam como gostariam de ser. Difícil não se apaixonar, não se perder. O anão se viu grande, o leão se viu carcará, Zé Miúdo, miúdo.
Juvenal perdera a magia há tempos, há tempos já não se via. Esperança é que enxergava nele o caminho.
Corcova era um leão diferente, tinha um probleminha na coluna, uma curvatura, um apêndice, um cisto grande, uma corcova. Meio leão, meio camelo, desmantelo da natureza.
Zé Miúdo caminhava sem destino, até o destino colocar ele no circo. E no circo se virava. O anão era seu amigo, homem de muitas línguas.